segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Cientistas de `meio período` desenvolvem jipe lunar autônomo



(Scientific American Brasil) Muitas pessoas tentam aproveitar seu tempo livre ao máximo fazendo exercícios, trabalho voluntário ou simplesmente recarregando as baterias. Outras gostam de usar esse tempo para construir robôs que podem ser mandados para a lua e depois deixados livres para passear por sua superfície.

Um grupo de engenheiros e pesquisadores que chamam a si mesmos de “Team Part-Time Scientists” (“Equipe de Cientistas de Meio Período”, literalmente) escolheu a última opção, e está construindo um jipe lunar chamado Asimov que, esperam eles, vencerá o cobiçado Google Lunar X PRIZE, no início de 2014.

Como o nome diz, pelo menos metade dos 100 membros dos Cientistas de Meio Período tem empregos integrais em empresas industriais ou universidades. Eles estão competindo contra 25 outras equipes para serem os primeiros a aterrissar um jipe robótico na lua e fazê-lo viajar500 metrossobre a superfície, enviando dados e imagens de alta definição para a Terra conforme passeia.

Os objetivos dos Cientistas de Meio Período representam os de todas as equipes que entraram na competição – eles querem algo mais duradouro que o primeiro prêmio, de US$20 milhões. Depois de guiar o Asimov além da marca dos500 metros, a equipe planeja colocar o jipe em modo autônomo pelo resto de sua exploração lunar, tornando-o o primeiro robô já construído a navegar a lua sem intervenção humana.

Além disso, a equipe planeja ser a primeira a usar unidades de processamento gráfico ultrarrápidas (GPUs, em inglês) – conhecidas por sua capacidade de renderizar gráficos complexos para videogames e simulações científicas – para ajudar seus sistemas de comando terrestre, o veículo de aterrissagem do Asimov, e talvez até o próprio Asimov, coleta, avalia e age com base em informações quase em tempo real.

A viagem autônoma é parte da estratégia dos Cientistas de Meio Período de projetar e testar novas tecnologias que poderiam impactar não apenas futuras viagens à lua, mas também outras empreitadas interplanetárias. “Nós não queremos desenvolver algo especificamente para a lua, que depois não sirva para mais ninguém”, declara Robert Böhme, fundador da equipe, que trabalha como consultor de segurança cibernética para o governo alemão em Berlim.

Outras equipes estão desenvolvendo tecnologias autônomas por razões semelhantes, incluindo a Astrobotic Technology, Inc. comandada pelo lendário produtor de robôs, William “Red” Whittaker, e a organização sem fins lucrativos Juxtopia Urban Robotics Briliant Application National (JURBAN). O sistema de aterrissagem da Astrobotic navegará de maneira autônoma alinhando dados em tempo real de câmeras e lasers com imagens de satélite da lua já existentes. Enquanto isso a JURBAN, assim como os Cientistas de Meio Período, está projetando seu jipe com capacidades autônomas.

Em busca da aterrissagem
Todos os competidores do Lunar X PRIZE têm acesso a imagens e dados coletados pelo Lunar Reconnaissance Orbiter (Orbitador de Reconhecimento Lunar, ou LRO) da Nasa, bem como de viagens anteriores tripuladas à Lua. Ainda assim, o Asimov não conhecerá o terreno específico que precisará atravessar até tocar a superfície lunar, aponta Wesley Faler, desenvolvedor chefe de software da equipe. Morando perto de Detroit, o trabalho diário de Faler é desenvolver softwares, incluindo programas para a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos.

“Nos últimos minutos antes da aterrissagem, nós receberemos uma quantidade tremenda de dados de vídeo da lua”, explica Faler. Além disso, o veículo de aterrissagem que colocará o Asimov na superfície tem sensores integrados de feedback de força que podem analisar a composição do solo ao redor da área de pouso. “Esperamos que essa combinação de dados visuais e táteis produza um nível de detalhe lunar sem precedentes”, observa ele.

O Asimov deve aterrissar em algum lugar na vizinhança do local de pouso da Apollo 17, que tem um solo fino e poucas rochas grandes capazes e dificultar o deslocamento do jipe. “Nós temos um algoritmo que calcula a densidade de rochas que mostra que podemos explorar muito sem encontrar problemas, como ficarmos presos tentando contornar uma rocha”, explica Böhme. Muito do que os cientistas sabem sobre esse local vem da missão original, e também dos sobrevoos do LRO.

Apesar de toda a preparação envolvida em uma aterrissagem lunar, as equipes não podem ter certeza absoluta de onde seus jipes de fato pousarão. “Estamos confiando em dados de resolução relativamente baixa, e podemos acabar descobrindo obstáculos que prejudicariam a aterrissagem”, destaca Faler. Böhme adiciona que “Precisaremos fazer ajustes no caminho e, para fazer esses ajustes, precisamos de informações”.

Anda, jipe!
As GPUs devem dar uma vantagem distinta ao Asimov se comparado a jipes anteriores, mesmo os que a Nasa enviou a Marte. Os jipes de lá se comportaram de maneira exemplar desde que pousaram no Planeta Vermelho em 2004, mas o Spirit (quando estava operante) e o Opportunity (que ainda está ativo) precisam parar frequentemente para coletar, avaliar e agir com base em informações sobre seus arredores, lembra Böhme. Os jipes precisam de quase três minutos para processar um par de imagens – um atraso que faz com que se movam a uma velocidade média de aproximadamente um centímetro por segundo.

Trabalhando com o Instituto de Robótica e Mecatrônica do Centro Aeroespacial Alemão, os Cientistas de Meio Período adicionaram um sistema de navegação autônoma ao jipe com a capacidade de processar múltiplas imagens por segundo. O instituto é conhecido por vários projetos de pesquisa, incluindo o sistema robótico móvel “Justin”, projetado para executar operações autônomas de longo alcance – apesar de ser em terra firme – e o Componente de Verificação Robótica do projeto ISS (ROKVIS) na Estação Espacial Internacional para estudar robôs usados no espaço.

O sistema de navegação do Asimov usa uma câmera estérea para, na falta do Sistema de Posicionamento Global que só pode ser usado na Terra, calcular seu próprio movimento em tempo real, gerar um modelo de 2,5 dimensões de seus arredores, avaliar esse modelo e seguir o caminho com menor probabilidade de terminar em colisão. “Um ambiente 2,5D consiste de polígonos planos localizados em bandas de distância discretas”, explica Faler. “Imagine dirigir ao longo de uma estrada com árvores próximas e montanhas distantes. Em 2,5D, todas as árvores e montanhas ficam à mesma distância, em um único plano achatado”. Se você se aproximasse de uma árvore, por exemplo, essa árvore assumiria dimensões extras enquanto as outras continuariam a parecer planas. Para a navegação, essa quantidade de dados é suficiente e reduz drasticamente o poder computacional necessário, observa Faler.

As GPUs mostram o caminho
Os Cientistas de Meio Período têm várias GPUs da NVIDIA Corp. à sua disposição. Computadores baseados em GPU terão vários papéis fundamentais, incluindo a filtragem das imagens do trânsito pelo espaço e da superfície lunar; o mapeamento rápido baseado em vídeos de dados e de sensores, calculando a melhor trajetória até o local de pouso; e otimizadores de comunicação com o jipe, apesar de um delay de alguns segundos entre a Terra e a lua. Os processadores GPU também analisarão sinais de radiofrequência na lua, que tem uma superfície composta em sua maior parte por materiais metálicos que interferem com esses sinais. Isso ajudará a equipe a determinar a melhor frequência para usar para comunicações pós-aterrissagem.

Apesar dos detalhes não estarem todos definidos, Böhme espera integrar uma GPU nos sistemas de computador do aterrissador e acredita que outra GPU poderia ser instalada no próprio jipe. Qualquer GPU usada no Asimov não poderia ser ligada até depois de o jipe atingir a marca de 500 metrose começar sua operação autônoma. “Há muito interesse em tornar possível uma GPU no jipe, mas existe uma chance de que, por razões técnicas como peso, blindagem e administração de temperatura, tenhamos que ficar com apenas uma GPU no aterrissador”, lamenta Böhme.

De acordo com Böhme, os humanos não operam tecnologias na superfície lunar há quatro décadas, e os eletrônicos atuais são muito mais sofisticados – e delicados – que aqueles usados nas missões Apolo. Como qualquer outro equipamento, uma GPU enviada no aterrissador lunar, ou no Asimov, precisaria ser fortalecida, o que inclui blindagem contra radiação e também componentes de administração térmica para protegê-lo das extremas temperaturas lunares.

Böhme reconhece que seria possível abordar qualquer uma das necessidades da missão sem o uso de uma GPU, mas enfatiza que um dos objetivos de sua equipe é forçar os limites da tecnologia disponível e até ajudar na redução do custo de viagens espaciais. “Não se ganha nada com uma única missão extremamente cara à Lua se ela não agir como uma porta para um conjunto inteiro de novas tecnologias”, declara ele.

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